sexta-feira, 15 de maio de 2015
Texto de Helena Siqueira.
Andreja Pejic, modelo e mulher trans.
Fonte: Google Imagens.
Quando comecei a estudar sobre o feminismo em geral, eu confesso que tive vontade de escrever sobre as pessoas trans* do primeiro ao último post desse blog, mas no último momento tive de encontrar outras temáticas porque há uma carência de referências sobre o assunto.
Só que nada mais justo do que encerrar minha participação no Inclusive expondo algo que há uma carência de abordagem, algo que muitas vezes é esquecido ou negligenciado nessa sociedade, e que talvez por esse motivo passa a ser pré definido como algo incorreto, vira um tabu e abre margem a mais um outro tipo de  preconceito (desnecessário, já que nós temos tantos outros, não é mesmo!?).
Lembrando que o feminismo praticado por nós que escrevemos esse blog segue uma proposta bem a ver com o nome dele, de inclusão, em que todos podem participar desde que sejam conscientes que a luta de TODAS as mulheres não é uma luta fácil, e que tenham a disposição de abrir sua mente para alcançar a igualdade e o respeito acima de tudo.

*"Transgênero: Conceito que abrange o grupo diversificado de pessoas que não se identificam, em graus diferentes, com comportamentos e/ou papéis esperados do gênero que lhes foi determinado quando de seu nascimento." (Jesus, Jaqueline, 2012: 15)

Uma coisa dessa temática particularmente tem me chamado a atenção: É que muitas vezes, para essas mulheres, não basta somente sofrer a rejeição na sociedade em geral como também no próprio feminismo, que enquanto instrumento para a luta do empoderamento feminino e igualdade de direitos, não as reconhece como iguais.
Koyama, aborda essa questão sobre a exclusão de mulheres transexuais no movimento feminista e justifica tal rejeição da seguinte forma:
"As objeções feministas a respeito da inclusão de mulheres transexuais nesse espaço são, na superfície, racionalizadas na base de que mulheres transexuais são fundamentalmente diferentes de todas as outras mulheres devido ao fato de que elas foram criadas com o privilégio masculino. Por causa de seu passado como meninos ou homens, eles são vistos como um passivo para a segurança física e emocional a outras mulheres."                                             (Brownmiller, 1975. Lido em Koyama, 2006: 4 - Tradução livre)
A verdade é que essa visão radical eu respeito e posso até achar compreensível talvez,  mas não apoio. Pelo fato de que independente da genitália de "origem" de qualquer pessoa, se essa não nasce em um corpo que é adequado ao seus sentimentos, a necessidade dela de se auto-aceitar já demanda um grande trabalho, depois de conseguir isso, é necessário começar uma constante "luta" também pela aceitação de uma sociedade preconceituosa, que rejeita sua condição.
Precisa de força em dobro né!?

Um exemplo que eu acho que pode ajudar a entender como a exclusão se dá é no mercado de trabalho: Pare e pense sobre o número de pessoas trans que já tivemos a oportunidade de ver no mercado "formal".
Eu até hoje não vi, mas a partir disso, escuto uma grande quantidade de pessoas que generalizam e acham que as mulheres trans só optam pela prostituição por livre e espontânea vontade.
Aaaaaaah, mas é claro ! Todo mundo quer se prostituir na vida não é mesmo!? Sempre é essa a primeira escolha de quem tem uma boa condição em termos de casa, estudos e família...
(Não recrimino a profissão também, só pra deixar claro).
Mas péraí, será que não podemos considerar a falta de oportunidades?
Isso é algo cruel para quem precisa lutar pela sobrevivência muitas vezes longe da própria família, que em vários casos rejeita o filho/filha trans e expulsa pelo fato daquela pessoa não se "adequar" ao que sua genitália o definiu, sem que houvesse de fato uma escolha do indivíduo sobre o que queria ser ao nascer.
E não só nesse aspecto, a vida de uma pessoa que tem como virtude a coragem de se assumir pode ser ainda pior considerando outros aspectos.
A pessoa que se assume, se encontra disposta também a encarar todos os círculos com que convive e estarão dispostos à recriminá-la.
Parece fácil? Pra mim nem um pouco.

O exemplo do mercado de trabalho foi uma das coisas que eu pude retirar desse vídeo aqui, que inclusive faz ótimas colocações sobre discriminação, sobre o preconceito no movimento LGBT que os trans enfrentam e foi feito por uma pessoa que realmente entende do assunto e merece atenção : Daniela Andrade.



Ironicamente, as primeiras vezes que tive contato com o feminismo, foi com uma essa mulher.
A Daniela é uma militante transfeminista, é diretora do fórum da juventude LGBT paulista, integrante da Comissão da diversidade sexual da OAB/Osasco e participa do coletivo Feminismo Sem Demagogia (parece que a página deles foi roubada, mas você pode conferir a página do Facebook nesse link aqui.). 
Eu a admiro e sigo na internet por sua força de luta, ela conquista essa minha admiração diariamente não só por falar abertamente sobre suas experiências pessoais bem impactantes (como ter sido expulsa de casa e já não manter mais contato com os pais), como também pelo quanto ela possui conhecimento sobre as questões de gênero e feminismo no geral.
Os estudos sobre questões de gênero desde então, foram os mais atrativos pra mim e talvez um dos principais motivos em escolher uma disciplina na faculdade que se relacionava a esse assunto.
Em outras palavras: Se hoje sou feminista , devo isso em grande parte à Daniela Andrade.

Ser uma mulher transgênero não faz com que eu realmente deixe de considerar a Daniela e todas as demais mulheres trans como grandes exemplos de lutas diárias contra o preconceito, porque através de todas as suas experiências eu percebo um pouco do que só as trans sofrem e precisam lidar, até mesmo dentro da própria luta do feminismo.

Quanto a uma solução para esse problema, Koyama ainda afirma:
"Eu já não sinto que a educação continuada sobre questões trans com as comunidades das mulheres mudariam seus comportamentos opressivos em qualquer grau significativo, a menos que elas estejam realmente dispostas a mudar. Não é a falta de conhecimento ou informação que mantém a opressão, é a falta de consciência feminista e princípio de compaixão que a mantém."                                                                                            (Koyama, 2006:7 - Tradução livre)
Ou seja, para que a mudança aconteça, é necessária a consciência de que uma luta por igualdade de gênero pode passar pela luta transgênero pois o objetivo é o mesmo.
Se o feminismo procura a igualdade de gênero, as mulheres trans também procuram, inclusive para que possam ter escolhas na vida que ultrapassem o preconceito dessa sociedade machista, e para possam ter escolhas diferentes, ao invés de se sujeitar às "migalhas" que recebem, no mercado de trabalho, familia, estudos e em todos os demais impasses diários pelos quais nós TODAS sendo mulheres somos atingidas diariamente.

Cartaz: Direitos transgêneros são direitos humanos.
Fonte: Google Imagens

Então é isso pessoal.
Um dia quem sabe possamos conversar mais sobre?
Beijos,
Helena. <3

Alguns links a mais sobre o assunto:

1) Fatos Desconhecidos : 10 Modelos Transexuais que lutaram para se tornarem mulheres.
Não gosto muito do título, mas as mulheres trans do mundo da moda realmente são maravilhosas, essa matéria também conta um pouco da história de cada uma delas.

2) Canal das Bee
Apesar de termos uma variedade de canais que tratam sobre a luta LGBT, esse canal tem várias entrevistas interessantes, em uma delas que conheci a Daniela Andrade inclusive, vale a pena conferir.

Referências Bibliográficas:

1) KOYAMA, Emi, 2006. "Whose feminist is it anyway - The unspoken racism of the trans inclusion debate". The transgender studies reader, 2006. Disponível aqui.

2) JESUS, Jaqueline Gomes De. "Orientações sobre identidade de gênero: Conceitos e termos". 2012, Brasília. Disponível aqui.



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