sexta-feira, 16 de outubro de 2015
Por Bruna Corrêa



Recentemente, uma amiga querida minha me ligou e começou a contar de maneira muito revoltada sobre uma constante que percebia acontecer na atual televisão brasileira – o hábito dos programas em colocar quadros de “transformações”.  Funciona assim: os produtores escolhem mulheres com a aparência “desleixada” e as arrumam. O motivo de sua consternação se derivou do fato de a maioria destes programas escolherem apenas mulheres para a realização da “transformação”. Afinal, questionou-se, por que somente mulheres devem passar por tal processo? Somente a beleza feminina necessita de reparos e é, por acaso, característica intrínseca às mulheres ficarem “desleixadas” ou serem afetadas pelo tempo?

Os padrões de beleza regem as mulheres desde o início da cristandade. Sempre se julgou o que era indecoroso ou não, o que era apropriado e decente para a cultura e os costumes de determinado lugar ou tempo. A partir do século XX, no entanto, os avanços na indústria de cosméticos e vestimentas gerou um boom na padronização da beleza feminina. O início de uma nova organização mundial colocou os Estados Unidos da América na vanguarda de um novo estilo – o american way of life. O começo da produção em série de
artigos de luxo começou a mudar o mundo ocidental em várias maneiras, mas também afetou as mulheres. O jeito “certo” de se portar, de se vestir e de se maquiar era distribuído em massa através de revistas e propagandas, e a situação atingiu a escala global com o advento da televisão. Não falo, porém, que a constante mudança da moda não afetou os homens, pois eles também mantinham a necessidade de se renovar constantemente. (SUANEGA; LISBOA; SILVA; PAULA; 2012)A questão aqui se configura no peso em que a “feminilidade” exercia (e exerce) sobre o comportamento feminino.
Você, é claro, pode me questionar com as mesmas sentenças de sempre – “ah, os tempos mudaram...”; “a moda é mutável e atualmente abarca vários estilos”. Não estou me referindo às possibilidades que o mundo da moda nos oferece – você pode seguir o estilo hippie chic ou gótico suave, mas na essência a moda te pede a mesma coisa: que você seja magra, tenha o cabelo liso (mas não tão liso), branca, jovem e que se “cuide” (aqui abarcando todos os processos chatos que fomos condicionadas a seguir: depilação, manicure e pedicure, alisamento de cabelo, a compra de roupas novas e tudo que nos coloca em um padrão.)
Você Mais Poderosa e Túnel da Beleza, quadros do programa Mais Você, da Rede
Globo, Beleza Renovada, do SBT, Moda e Estilo, da TV Globo Minas e Arruma Minha Esposa, da Record, são apenas alguns programas brasileiros que reproduzem esse padrão de comportamento imposto pela sociedade. Neles, somente mulheres precisam ser “renovadas”, e todas saem praticamente iguais umas as outras no final. Normalmente o programa mantém um patrocínio com uma loja de roupas e um salão de belezas, então todas as mulheres acabam vestindo o mesmo estilo de roupa e usando o mesmo penteado (o típico cabelo liso e ondulado nas pontas com babyliss). Às vezes, o único “defeito” da pessoa é que ela não usa maquiagem no dia-a-dia – aparentemente um pecado mortal para a indústria do entretenimento. Isso sem comentar daquela mulher que comete o ultraje de ser acima do peso, ou para piorar, “velha”! Aí, não tem jeito: ela vai ser constantemente criticada, vão manda-la ir à academia ou fazer um peeling rejuvenescedor.
A cultura do machismo é indisfarçável. Para esses programas, somente a mulher tem a ousadia de cair no desleixo, de parar de se cuidar... Os homens permanecem perfeitos e a missão delas na vida é agradá-los, claro. A chamada de inscrição do programa Arruma Minha Esposa me despertou várias sensações, desde o nojo total à descrença:
“Se a sua esposa anda muito relaxada, não é mais aquela princesa de antes e você acha que já está na hora de dar um jeito nela, faça sua inscrição e deixe O Melhor do Brasil consertar sua esposa!” (O MELHOR DO BRASIL, 2015)
E este é somente um exemplo das várias chamadas ridículas produzidas por programas de televisão voltados, principalmente, para um público-alvo: as donas de casa e as pessoas idosas.
Outros programas, como Transformação da Face, do Hoje em Dia, Esquadrão da Moda, do SBT, e Arruma Meu Marido, da Record abarcam homens também – o último, inclusive, surgiu da reclamação das espectadoras de que os seus maridos também precisariam de “reparos”, e é derivado do quadro Arruma Minha Esposa. Tanto ele como Transformação da Face lidam com casos extremos (quando o homem não tem boa parte dos dentes, por exemplo); como se a único defeito válido de se consertar em um homem é a sua arcada dentária. Esquadrão da Moda é o mais tranquilo destes últimos, trazendo tanto homens como mulheres, e maneirando nos comentários machistas. Mesmo assim, estes programas continuam sendo entretenimento barato e ofensivo – ninguém precisa que outra pessoa te dite o que vestir ou não, ou como se portar. 

Referências Bibliográficas:
O MELHOR DO BRASIL. Arruma Minha Esposa. 2015, disponível aqui.
 PALOMINO, Erika - A moda. São Paulo: Publifolha, 2002.
SUANEGA, Camila; LISBOA, Daiane Carla; SILVA, Maria Santos da; PAULA, Vandressa Bueno de. Conceito, Beleza e Contemporaneidade: fragmentos históricos no decorrer da evolução estética. Univali.  2012, Santa Catarina.

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