sexta-feira, 16 de outubro de 2015
Por Luiza Torrezani Todo domingo é a mesma coisa, a família reúne e lá vem o interrogatório para minha prima mais velha, de uns 28 anos. "Você nessa idade e não tem nem namorado, quando vai engravidar?" "Você está envelhecendo, já está passando da hora, hein?"  E se o único filho que ela quiser ter for um gato ou cachorro, qual o problema?

A gente ri, brinca e depois esquece. Mas isso não é só uma brincadeira. 
Com o estilo de vida que temos hoje mudaram-se as prioridades, mudaram a disponibilidade, mudaram as perspectivas. 
Ser mãe não é mais uma atividade inquestionável, como era no tempo de nossas avós. Ser mãe é uma opção, e não uma obrigação. Com o passar dos anos e uma maior conscientização do empoderamento das mulheres, elas passaram a ter mais domínio dos seus corpos, passando a perceber que fazemos dele o que quisermos, afinal, ele é nosso. No texto O Empoderamento Feminino na Extensão, uma Proposta de Promoção à Saúde,  em que se configura o “empoderamento, em Promoção da Saúde, segundo Teixeira (2002), como “um processo que ajuda as pessoas a afirmar seu controle sobre os fatores que afetam a sua saúde” (apud Airhihenbuwa, p. 345). 

Com isso, atualmente está aumentando o número de mulheres que optam por não terem filhos, caracterizando a geração NoMo, "Not mothers". A Geração NoMo busca “o respeito de uma sociedade fundamentada na absurda crença de que uma mulher tem de dar à luz pelo menos uma vez na vida”. Assim argumenta a associação britânica Gateway Women, que pode ser considerado um grupo de apoio que oferece palestras sobre o assunto e promove reuniões para a discussão do tema.
São várias as razões que podem levar à essa decisão, seja ela uma questão financeira, de priorizar a carreira, de falta de vontade, de dificuldade de encontrar um parceiro ideal, entre muitas outras. 
Segundo a professora Marlise Matos, coordenadora do Nepem (Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher da UFMG), está ocorrendo um "fenômeno demográfico". "Com a escolarização, entrada da mulher no mercado de trabalho e com a criação do anticoncepcional, as mulheres começaram a ter escolha. O planejamento familiar passou a ser possível e elas viram que, mesmo trabalhando, continuariam responsáveis pelos afazeres domésticos e cuidados com as crianças. A tripla rotina é muito pesada, de mãe, trabalhadora e mulher. Uma consequência inevitável desse processo é a recusa à maternidade. É um fenômeno irrevogável".



Além da rotina de trabalho de uma mulher, muitas vezes, ao chegar em casa, a responsável pelas atividades domésticas é ela, um dos fatores que pode contribuir na dificuldade em conciliar uma gravidez às demandas do dia a dia. Segundo a Pesquisa Nacional de Domicílios (Pnad), do IBGE, mulheres gastam 23,9 horas da semana cuidando de afazeres domésticos, enquanto os homens ficam com apenas 9,7 horas. Em uma gravidez a divisão de tarefas geralmente não é tão diferente da dos afazeres domésticos. Na maioria dos casos, os cuidados com a criança recaem para a mãe.

Marlise também relata que "essa história de que a masculinidade se reinventou é equivocada. Temos sim alguns pais que assumem de fato a criação dos filhos, mas a maioria ajuda ocasionalmente a trocar uma fralda. As mulheres continuam sendo quase que exclusivamente responsáveis pelo trabalho doméstico e pelos filhos e isso acaba sendo um entrave para os horizontes profissionais, intelectuais e de lazer das mulheres. Daí a recusa, o desejo de não maternar."

Porém a sociedade, em geral, lida com essa situação de uma forma a julgar a mulher, pelo fato dela não estar "cumprindo" o seu papel, por não fazer o que ela foi "destinada" biologicamente. A professora Marlise analisa essa situação afirmando que "acaba sendo doloroso para essas mulheres, que são vistas muitas vezes como deficientes, já que não cumprem o 'papel social' que deveriam e, quando acabam se rendendo e optando por filhos, romantizam a maternidade para facilitar a aceitação dessa condição imposta", analisa a professora. 


Simone de Beauvoir em seu livro o Segundo Sexo, segundo volume, capítulo II, A mãe, pontua: “E, particularmente, há um século mais ou menos, a função reprodutora não é mais comandada pelo simples acaso biológico: é controlada pela vontade (…) A maternidade forçada leva a deitarem no mundo crianças doentias, que os pais são incapazes de alimentar, que se tornarão vítimas da assistência pública, ou crianças mártires”.

A professora Marlise conclui esse tema apresentando a necessidade das mulheres não lidarem com esse tema como se elas fossem as únicas responsáveis pelas decisões acerca da gravidez. "Precisamos ter uma mudança de mentalidade. São necessários o pai e a mãe para a concepção da criança. Então, consequentemente, ambos devem ser igualmente responsáveis pela criação da mesma. Na prática, a gente vê que isso ainda não acontece, mas a discussão é importante justamente por isso, para tentarmos mudar essa realidade”.

"A Geração NoMo se apresenta como a reivindicação de um espaço de respeito e liberdade: o respeito às decisões de uma pessoa e à liberdade de poder tomá-las sem ter de dar explicações."

Bibliografia

ANDRADE, Vanusa de Lemos;  DINIZ , Márcia Isabel; FERNANDES, Thatiana Verônica Rodrigues de Barcellos; SILVA, Keila Cristina Santana da Gentil . O Empoderamento Feminino na Extensão, uma Proposta de Promoção à Saúde. UERJ. Disponível em:  <http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/interagir/article/view/2639/1774&gt;.

BEAUVOIR, Simone. O Segundo Sexo. V 2. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.


O QUE as feministas não aguentam mais ouvir. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/blogs/feminismo-pra-que/o-que-as-feministas-nao-aguentam-mais-ouvir-7319.html>

Geração NoMo: A rebelião das mulheres que não contemplam a maternidade. Disponível em: <http://brasil.elpais.com/brasil/2014/08/23/sociedad/1408813287_310188.html>

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